(LEIA O DÉCIMO CAPÍTULO EM: http://negaescreve.blogspot.com.br/2013/12/paul-e-marrie-cap-10-meu-segundo-dia.html )
E naquela manhã, a cafeteria
de Sr. Brian não abriu.
Fiquei ali, durante algum tempo,
com a sacola de roupas de Marrie nas mãos, esperando que algo de novo
acontecesse. Todavia, não era pela cafeteria aberta que eu esperava. Para falar
a verdade, meu caro leitor, eu provavelmente estava ali, parado, porque ainda
estava um pouco bêbado, e porque não conseguira dormir em casa. E nem em meu
apartamento.
Segui a passos calmos e largos
até chegar ao hospital. Não era meu dia de trabalho, mas precisava de um café.
E de qualquer lugar que não fosse a minha casa. Ainda era muito cedo, e havia
apenas três pessoas na lanchonete esperando por um café quente. Acomodei-me
junto a elas.
Eu falhara na noite anterior com
as duas pessoas que eu amava em minha vida, se é que era possível dividir o
coração em dois sem que isso se tornasse um problema. Porém, independentemente
de amar duas pessoas ou não, eu falhara naquela noite. Eu deixara David sabe-se
lá por quantas horas me esperando, e partira de vez o coração de Marrie.
Fiquei lembrando-me de sua voz
angustiada, revelando o seu passado cruel, colocando em palavras toda a dor que
um dia eu notara em seus olhos. Lembrei também da cicatriz na região abdominal
de Marrie, que ontem descobri ser o resquício de uma cirurgia malfeita,
provavelmente realizada sem qualquer cuidado cirúrgico, apenas para que ela
continuasse sendo estuprada por “ele” e não precisasse mais fazer abortos.
Meus olhos encheram-se de
lágrimas, pois não era só o coração de Marrie que estava partido. Eu também não
sabia mais o que fazer com o meu.
Pensei também em David, e em como
ele devia estar furioso comigo, e que eu deveria ir até a sua sala desculpar-me
com ele. Mas por mais que eu soubesse o quanto eu estava errado, e em como fora
desagradável a situação em que o colocara ontem, não tinha a menor vontade de
procurá-lo para fazer as pazes. Só queria esperar que aquela dor de cabeça
terrível passasse e então eu pudesse procurar Marrie. E me desculpar mais uma
vez.
Entretanto, eu tinha plena
consciência, sentado naquela cadeira fria da lanchonete do hospital, que não
era mais um menino, um jovem apaixonado por uma pessoa proibida. Sabia que já
era adulto, senhor responsável pelas minhas atitudes, e que por mais que a
noite de ontem terminara em briga, não poderia deixar o meu duradouro
relacionamento com David por Marrie. Seria muito melhor para mim esquecer tudo
o que estava acontecendo com os meus sentimentos e focar-me no pedido de
desculpas que deveria dar dali alguns minutos.
Fui surpreendido por Dr. Thomas,
que sentou-se a mesa fazendo um pouco de barulho:
- Vocês não vão acreditar quem
foi a última vítima do Dr. David! – disse ele, em tom baixo, mas audível para
nós que estávamos próximos.
Ao sair de meus devaneios,
percebi que o meu café já estava posto em minha frente. Dei um longo gole
enquanto ouvia, curioso, a peripécia que Dr. Thomas contava.
- Entrei aqui ontem por volta de
seis horas da tarde, para dar início ao meu plantão. As duas primeiras horas
foram muito tumultuadas, houve um acidente na Avenida 3, mas após isso, tudo se
aquietou neste hospital. Quando foi mais ou menos uma hora da manhã, fui até o
jardim fumar um cigarro, e adivinha quem o Dr. David estava deixando aqui na
porta? A ENFERMEIRA CELINA! – ao pronunciar o nome da tal enfermeira, Dr.
Thomas bateu uma palma levemente.
- Dr. David?! – não estava
acreditando no que acabara de ouvir.
- A enfermeira Celina? Meu Deus,
mas faz apenas duas semanas que ela começou a trabalhar aqui! Este Dr. David
faz questão de “batizar” todas que entram neste hospital. – Dr. John, um dos
médicos sentados à mesa, comentou e ao mesmo tempo ria com satisfação por estar
sabendo da novidade que logo percorreria todo o hospital.
- Esperem, vocês estão falando do
mesmo Dr. David que eu estou pensando? – perguntei, espantado.
- E existe outro Dr. David neste
hospital, Doutor-Anjo? – retrucou Dr. Thomas.
- Este Paul é uma figura! –
sorriu Dr. John. – Só porque tem uma conduta implacável, fecha os olhos para o
que acontece neste hospital!
- E não venha me dizer que você
não sabe, Paul! O próprio Dr. David viu você na hora em que parou o carro aqui
na porta! Você estava dançando com a sua nova namorada na lanchonete do Sr.
Brian. – explicou-me Dr. Thomas com calma. – Você sabe por que eles não abriram
hoje? Senti falta de tomar o meu café lá.
- Não, não eu não sei. – menti,
enquanto ajeitava os óculos em meu rosto. – E estou espantado com esta história
sobre Dr. David. Eu realmente não sabia. – agora dissera a verdade, fingindo
não estar me importando com o que acabara de ouvir.
- O Dr. David tem uma espécie de “tara”
com qualquer enfermeira novata deste hospital. É assim desde sempre, Paul. E
você sabe, ele é o responsável por qualquer promoção aqui dentro. Muitas se
deixam levar, outras realmente se apaixonam. Já ouvi dizer que até a mulher
dele sabe, mas que ele implorou para que ela não se divorciasse dele para que
ele pudesse manter a pose perante seus superiores aqui.
- É uma pena que Dr. David tenha
que se prender às aparências para poder ser feliz. – ironizei, enquanto
levantava da cadeira.
- É uma pena mesmo, Paul, mas
você não vai acreditar em quantas pessoas ainda se escondem por de trás de uma
moral inabalável.
- Nem posso imaginar, Dr. Thomas.
Ao sair da lanchonete, nasceu em
mim algo que eu nunca havia sentido em toda minha vida: coragem. Pela primeira
vez em muitos anos, eu não mais imaginei uma situação: decidi vive-la de vez. E
também não pensei muito sobre o que iria dizer, não me planejei para o teatro
de sempre, apenas deixei-me sentir e fazer o que precisava ser feito. Fui até o
consultório de David e esperei alguns minutos até que ele me recebesse.
- Não irei mentir que é uma
surpresa sua vinda em minha sala, Dr. Paul, porque já imaginava que fosse
aparecer por aqui hoje, com o rabinho entre as pernas. – David se inclinou
sobre sua mesa e me olhou por cima de seus olhos. Aquele olhar que até pouco
tempo me amedrontava, naquele minuto apenas me fez sentir mais seguro. Era a
minha hora de dizer a verdade.
- David...
- Dr. David, por favor.
- David, - repeti, em tom frio e
um pouco mais alto. – se não quiser que eu denuncie você por estar assediando sexualmente
as enfermeiras deste hospital, é melhor você não me interromper mais enquanto
eu falo.
- Sobre o que você está falando,
Dr. Paul? – David se recostou na cadeira, e eu vi, que apesar de seu tom
confiante, que David estava mentindo e sabia exatamente sobre o que eu estava
falando.
- David, não vim aqui para
contestar suas atitudes, muito menos para julgá-las. Aliás, cansei de tudo
isso! Vim aqui para julgá-lo sim! Você é um porco sujo, um babaca, um escroto,
que está comendo este bando de mulher porque não é homem o bastante para
afirmar que é homossexual! – não gritava, mas tinha um tom de voz acima do
normal. – Você precisa se auto afirmar, e ficava usando dessas novatas para ver
se algo muda em você! Mas posso te contar uma coisa, “Doutor”? Isto não vai
mudar, nada vai mudar em você! Não adianta você negar, se esconder atrás de sua
esposa, de seus filhos, de seu emprego, sua carreira, você vai continuar sendo
a bicha que me procurou e me pediu para que fosse seu amante. Você sabe muito
bem que o que você gosta é o que nenhuma mulher pode te oferecer...
- Basta, Dr. Paul. Saia da minha
sala imediatamente antes que eu lhe dê um murro e...
- E o quê, David? Você quer resolver
isso como dois homens selvagens? Poupe-me deste diálogo! Vim aqui para que
dizer que quando fiquei sabendo a verdade sobre você, não senti ciúmes, nem
tristeza, e nem decepção! Para falar a verdade, na hora eu não senti nada! Nem
uma pitada de sentimento. Apenas alívio. Sim, “Doutor”, - ironizava. – senti alívio
porque esta era a deixa que eu tinha para lhe dizer que eu me eu cansei de
comer você, deste sexo vazio e prognóstico que tínhamos, e estou indo embora.
David tinha uma expressão
indecifrável naquele momento: olhos arregalados, punhos fechados sobre a mesa,
coluna ereta e tensionada. Sabia que o havia pego de surpresa, e que ele estava
sem respostas.
- Vai voltar para aquela piranha,
Paul?
- Não, David. Não vou “voltar para
aquela piranha”, porque para ser bem sincero, eu nunca saí dela. Desde o
primeiro dia em que a vi.
Fechei a porta de sua sala com
cuidado e sorri para sua secretária, em tom de despedida. Saí do hospital com
um sorriso no rosto, e decidi ir até meu apartamento descansar. Enfim o sono
chegara. Era a hora de dormir para então acordar sendo um novo Paul. O Paul de
Marrie.
AMEI O DESFECHO DESTE CAPÍTULO! E TODO ELE ELETRIZANTE, NEGA! AMEEEI!
ResponderExcluirHoje li os capitulos 10 e 11 : que escritora maravilhosa que sabe envolver a gente............... te amo sempre, mamae
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